Balanço Crítico das Políticas de Educação do Governo do Paraná Ratinho Jr.: Precarização, Gerencialismo e Perda da Autonomia Escolar

Balanço Crítico das Políticas de Educação do Governo do Paraná  Ratinho Jr.: Precarização, Gerencialismo e Perda da Autonomia Escolar

*Luiz Antonio Sypriano


Resumo

O presente artigo analisa criticamente as políticas educacionais implementadas pelo governo Ratinho Jr. no estado do Paraná, com ênfase nas condições de trabalho e remuneração dos trabalhadores da educação, no esvaziamento do Plano de Carreira Docente, na perda da autonomia pedagógica das escolas, no uso intensivo de avaliações de larga escala, nas mudanças curriculares do Ensino Médio para 2026 e no avanço da terceirização e militarização da educação pública. A partir de dados empíricos, documentos oficiais, legislação educacional e literatura crítica da área da educação, argumenta-se que tais políticas aprofundam a precarização do trabalho docente, reforçam a lógica neoliberal e gerencialista e comprometem o direito social à educação pública, democrática e socialmente referenciada. O artigo também aponta a resistência dos trabalhadores da educação como elemento central para a construção de alternativas emancipadoras.


Palavras-chave: Política Educacional; Trabalho Docente; Neoliberalismo; Educação Pública; Paraná; Comitês nas Escolas.


Introdução


As políticas educacionais, implementadas no Brasil nas últimas décadas, têm sido fortemente influenciadas por orientações neoliberais - principalmente a partir da década de 1990 -, quando foram marcadas pela centralidade da lógica fiscal, pela gestão por resultados e pela crescente mercantilização dos direitos sociais. No estado do Paraná, com o governo de Carlos Massa Ratinho Jr., isso se aprofunda ainda mais nessa tendência, ao tratar a educação pública não como direito social, mas como custo a ser administrado. Por conseguinte, este artigo tem como objetivo realizar um balanço crítico das políticas educacionais do governo Ratinho Jr., a partir da perspectiva dos trabalhadores da educação e da realidade concreta das escolas públicas estaduais. Sendo que a análise parte do pressuposto de que não há política pedagógica neutra e que as reformas educacionais estão inseridas em um projeto de sociedade que expressa interesses de classe (FRIGOTTO, 2010; MÉSZÁROS, 2008).


Condições de Trabalho e Questão Salarial Docente:

Intensificação e Precarização


A política do governo Ratinho Jr. para trabalhadores da educação caracteriza-se pelo aprofundamento da precarização do trabalho docente, com a  intensificação da jornada, o aumento das tarefas burocráticas e administrativas, o uso compulsório de plataformas digitais instáveis e a ampliação do controle e da vigilância sobre o trabalho pedagógico.

Muitos estudos recentes apontam que a intensificação do trabalho docente têm levado ao adoecimento físico e mental dos professores, fenômeno amplamente documentado na literatura (ANTUNES, 2018; OLIVEIRA, 2004). Enquanto que, no Paraná, essa realidade é agravada pela pressão constante por resultados em avaliações externas e pelo esvaziamento da autonomia didático-pedagógica.

Já no campo salarial, o governo adotou uma política de arrocho e congelamento disfarçada de responsabilidade fiscal; embora com reajustes concedidos, foram insuficientes para recompor as perdas inflacionárias, corroendo, pelo contrário, o poder de compra da categoria. Mesmo com o Piso Salarial Profissional Nacional do Magistério, previsto na Lei nº 11.738/2008, esse foi tratado como teto e não como referência mínima, contrariando seu princípio estruturante.

Assim, o salário, enquanto forma de reconhecimento social do trabalho, é um elemento central para a valorização profissional; por outro lado, com esses governos liberais, a sua desvalorização expressa, na prática, a negação da centralidade do trabalho docente na garantia do direito à educação (SAVIANI, 2008).


O Desmonte do Plano de Carreira Docente


Quanto ao Plano de Carreira Docente da Seed-PR, esse sofreu, durante o governo Ratinho Jr., um processo contínuo de esvaziamento. Avanços e progressões foram congelados ou dificultados por entraves burocráticos, comprometendo o caráter estruturante da carreira enquanto instrumento de valorização profissional.

Enquanto a progressão por titulação e tempo de serviço, historicamente concebida como incentivo à formação continuada, tornou-se lenta e incerta. Tal cenário produz desestímulo, especialmente entre os docentes mais jovens, que passam a não enxergar perspectivas de permanência na rede pública estadual.

Além disso, a adoção de abonos e reajustes pontuais, não incorporados à carreira, rompe a lógica do plano e fragiliza inclusive os direitos previdenciários. Conforme destaca Paro (2012), políticas de valorização fragmentadas enfraquecem o caráter público da educação e aprofundam a lógica do trabalho precarizado.


Política Pedagógica, Avaliações de Larga Escala e

Perda da Autonomia Escolar


A política pedagógica do governo Ratinho Jr. é marcada pela imposição da chamada “gestão por resultados”, que subordina o trabalho pedagógico a metas, indicadores e plataformas digitais centralizadas pela Seed-PR. Tal modelo esvazia a autonomia das escolas e dos professores, contrariando os princípios da gestão democrática previstos na Constituição Federal e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB nº 9.394/1996).

Quanto às avaliações de larga escala — como Saeb, Ideb e avaliações estaduais —, essas passaram a orientar o currículo e a organização do ensino, transformando o processo educativo em treinamento para provas. Conforme analisam Freitas (2014) e Libâneo (2012), essas avaliações operam como mecanismos de controle, ranqueamento e responsabilização, desconsiderando as desigualdades sociais e territoriais que atravessam a escola pública.


A Reforma do Ensino Médio e a Mudança da Grade Curricular para 2026


No que se refere às mudanças anunciadas para a grade curricular do Ensino Médio em 2026, o que se percebe é que aprofundam a lógica da Reforma do Ensino Médio nacional, reduzindo o currículo comum e enfraquecendo disciplinas fundamentais para a formação crítica, como Filosofia, Sociologia, História e Artes.

Analisa-se que esse modelo consolida a dualidade educacional histórica no Brasil: uma formação ampla e científica para a a classe das elites (ricos) e uma formação instrumental, aligeirada e empobrecida para a juventude da classe trabalhadora (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2012); por conseguinte a escola pública passa a funcionar como espaço de adaptação precoce ao mercado de emprego precarizado, em detrimento da formação humana integral.


Terceirização e Militarização:

Estado Mínimo para Direitos e Máximo para o Controle


A terceirização e a militarização constituem dois eixos centrais do projeto do governo Ratinho Jr. Enquanto a terceirização fragiliza vínculos, reduz direitos e transforma o Estado em gestor de contratos - transferindo recursos públicos ao setor privado -; já a militarização das escolas, por meio da expansão dos colégios cívico-militares, representa um ataque direto à gestão democrática e à autonomia pedagógica.

Conforme argumenta Althusser (1985), a escola é um aparelho ideológico central do Estado; por isso a militarização da Escola Pública reforça o controle social e a disciplina autoritária, submetidos à violência institucional, sobretudo sobre a juventude da classe trabalhadora, sem buscar respostas às causas estruturais dos problemas educacionais e sociais.


Resistência e Organização Coletiva:

Comitês de Defesa da Escola Pública


Diante desse cenário, a criação de Comitês de Defesa da Escola Pública emerge como estratégia legítima de resistência e organização coletiva, porque esses espaços fortalecem a gestão democrática, promovem o debate crítico sobre as políticas educacionais e articulam ações de denúncia e mobilização da comunidade escolar.

Posto que a história da educação brasileira demonstra que nenhum direito foi conquistado sem luta coletiva (SAVIANI, 2011). Por conseguinte, a resistência de trabalhadores da educação no Paraná constitui o elemento central para a construção de um projeto alternativo de educação pública, democrática e emancipadora.


Considerações Finais


Considera-se que um balanço das políticas educacionais do governo Ratinho Jr. se faz mais do que necessário, ao revelar que a sua política subordina a educação pública à lógica do mercado, aprofunda a precarização do trabalho docente e compromete o direito social à educação. Como se sabe, não se trata de modernização, mas de desmonte; não de eficiência, mas de controle e retirada de direitos da população a uma educação de qualidade para todos os cidadãos.

Ao se defender a educação pública, implica defender condições dignas de trabalho, carreira valorizada, salário justo e autonomia pedagógica. Entretanto, isso só será possível por meio da organização coletiva, da luta política e da resistência cotidiana nas escolas.


Referência Bibliográfica


ALTHUSSER, Louis. Aparelhos ideológicos de Estado. Rio de Janeiro: Graal, 1985.

ANTUNES, Ricardo. O privilégio da servidão. São Paulo: Boitempo, 2018.

FRIGOTTO, Gaudêncio. A produtividade da escola improdutiva. São Paulo: Cortez, 2010.

_________; CIAVATTA, Maria. Trabalho e educação no Brasil. São Paulo: Cortez, 2012.

FREITAS, Luiz Carlos de. Os reformadores empresariais da educação. Campinas: Autores Associados, 2014.

LIBÂNEO, José Carlos. Adeus professor, adeus professora? São Paulo: Cortez, 2012.

MÉSZÁROS, István. A educação para além do capital. São Paulo: Boitempo, 2008.

OLIVEIRA, Dalila Andrade. A reestruturação do trabalho docente. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.

PARO, Vitor Henrique. Gestão democrática da escola pública. São Paulo: Cortez, 2012.

SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. Campinas: Autores Associados, 2008.

_______l. História das ideias pedagógicas no Brasil. Campinas: Autores Associados, 2011.


*(Professor de Filosofia da Rede Pública Estadual do Paraná)

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