Da Socialização das Ciências à Produção da Superficialidade: A Escola na Era do Capitalismo Financeirizado

Da Socialização das Ciências à Produção da Superficialidade: A Escola na Era do Capitalismo Financeirizado

Luiz Antonio Sypriano


Resumo:
O presente texto discute o desânimo docente como expressão da contradição estrutural entre a função histórica da escola — socializar criticamente o conhecimento — e sua função atual, subordinada à lógica do capitalismo financeirizado e rentista. Analisa-se como a educação, ao invés de promover a apropriação das ciências, tem sido orientada à superficialidade, voltada à performatividade e aos resultados quantificáveis, produzindo sujeitos alienados e analfabetos funcionais. Argumenta-se que tal processo não constitui um desvio, mas um projeto político coerente com a atual etapa imperialista e monopolista do capital.


Palavras-chave: educação; trabalho docente; capitalismo financeirizado; alienação; imperialismo.


Vivemos o desânimo que atravessa o trabalho docente, que não se trata de um fenômeno individual, mas social e histórico. Ele emerge da transformação da escola, que deixou de ser um espaço de socialização crítica das ciências para tornar-se um aparelho de adaptação à lógica do capital. Na etapa atual do capitalismo — marcada pela financeirização, pelo rentismo e pelo domínio de conglomerados monopolistas transnacionais — a educação é reconfigurada conforme as necessidades da acumulação (HARVEY, 2011; LENIN, 2012).

Com isso, a centralidade do capital financeiro desloca a produção de riqueza do processo produtivo para a especulação e o endividamento. O resultado é a intensificação da desigualdade e da concentração de poder. Nesse contexto, a escola deixa de ter como finalidade a formação integral e emancipadora, como sublinham Saviani (2008) e Mészáros (2005), e assume a função de treinamento adaptativo, voltado a competências instrumentais de curto prazo. Por conseguinte, a educação torna-se performativa (GENTILI, 2019): o que importa é cumprir metas, índices e avaliações padronizadas.

Desse processo advém a produção sistemática de um conhecimento superficial, fragmentado e esvaziado de sentido. Forma-se um estudante capaz de decodificar palavras, mas incapaz de compreender criticamente a realidade — isto é, um analfabeto funcional no sentido estrutural do termo. Essa alienação não é falha da escola, mas resultado de sua subordinação ao capital: sujeitos que não compreendem o mundo não se organizam para transformá-lo.

O professor, por sua vez, vive a contradição entre sua função histórica — mediar o acesso às formas superiores da cultura e do conhecimento — e a função que lhe é imposta — executar planos, preencher plataformas, produzir dados. Seu desânimo, portanto, não expressa desistência, mas consciência da incompatibilidade entre educação emancipadora e capitalismo financeirizado.

Portanto, reconhecer essa contradição é o primeiro passo para superá-la. Isto porque a educação só pode recuperar sua força transformadora quando vinculada a um projeto de emancipação social, e não à reprodução da ordem vigente.


Referência Bibliográfica

GENTILI, Pablo. A pedagogia da exclusão. São Paulo: Vozes, 2019.
HARVEY, David. O enigma do capital. São Paulo: Boitempo, 2011.
LENIN, V. I. Imperialismo: fase superior do capitalismo. São Paulo: Boitempo, 2012.
MÉSZÁROS, István. A educação para além do capital. São Paulo: Boitempo, 2005.
SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. Campinas: Autores Associados, 2008.


*(Professor de Filosofia da Rede Pública Estadual-Pr)


Comentários

  1. Ótimo texto! Denuncia a realidade cobrada nos colégios na educação estadual paranaense.

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